quinta-feira, novembro 13, 2008

Metáforas

Vocês, crianças dos anos 80 como eu, se lembram daquele desenho do pica-pau e a bruxa? Ok, eu já devo ter falado aqui umas 500 mil vezes sobre esse desenho – dois anos de blog, a pessoa vai ficando meio repetitiva. Mas é que ele é emblemático pra mim por uma série de motivos.

Eu nunca gostei muito do pica-pau, devo confessar. Além de extremamente irritante eu sempre morria de pena dos inimigos dele – assim como do Coiote ,do Papa-léguas, do Tom, do Jerry. Sempre tive uma queda pelos oprimidos. O pica-pau era um sádico, vamos ser sinceros. Mas, ainda assim, numa época sem videocassete e onde TV a cabo parecia coisa de ficção científica, nós, pobres crianças, esperávamos pacientemente a chegada do nosso desenho favorito em meio a uma pilha de desenhos ruins e repetidos (eu sempre digo que se na minha época de criança existissem esses canais de desenho 24 horas por dia e internet eu estaria até hoje na terceira série primária. Aliás, mudando totalmente de assunto, hoje eu li no jornal que dentre as regras que a Madonna impõe para o ex marido ver os filhos está não deixar que eles vejam televisão ou leiam revistas ou jornais. Tsc, tsc, tsc...o que ela espera com isso? Criar meninos-bolha?).

Pois bem. Voltando a esse desenho especificamente. Ele tá lá de encrenca com a bruxa. A bruxa quer pegá-lo, sabe-se lá por que. Ele tenta enganá-la. Não me lembro dos meandros da história, mas eu sei que tudo acaba numa fábrica de vassouras. Pica-Pau-Sade taca a vassoura da bruxa no meio das outras vassouras. Que, evidentemente, não são mágicas e não voam como a da bruxa. A coitada não tem como se locomover. Ta a pé. Daí é obrigada a testar todas as vassouras pra ver qual é a sua. Ela testa cada uma montando nela e dizendo “e lá vamos nós!”. Mas não é a vassoura dela. Mas ela não desiste. E tenta, mais uma vez, dessa vez com mais empolgação: “e lá vamos nós!!!!”. Em outras, apenas com o tom burocrático dos que sabem que é preciso acreditar, embora não mais o consiga fazer realmente. O desenho termina com ela tentando e tentando. E o pica-pau dando sua sádica risada.

(Eu queria ter a persistência da bruxa, mas em geral, prefiro sentar e chorar ou descer puta da fábrica e andar 20 quilômetros a pé. Não enfrento 100 vassouras ruins pra achar a minha boa, má nem fudendo! Mesmo porque se ela é mágica ela tem que me encontrar, vocês não acham?).

Pior do que esse só aquele que o Tom sonha que morreu e foi pro inferno por causa das maldades que faz com o Jerry. (Gente, como eu amava esse desenho! Pena que ele passava pouco). Daí ele chega no inferno e faz um acordo com o Capeta (que é aquele Cachorrão Mau): ele tem a chance de voltar a Terra e, caso consiga uma assinatura do Jerry, perdoando-o de todas as maldades, sua alma estaria a salvo e ele iria pro Céu. Ele tem 24h pra fazer isso. Ele desce, tenta tratar o Jerry bem, pede a ele de todas as formas, mas o ratinho é inflexível. No último minuto Jerry resolve, finalmente, assinar. Mas a caneta não pega. Nisso, as doze badaladas soam. As portas do inferno se abrem e Tom começa a ser tragado pelas labaredas do Coisa Ruim. Nisso Tom acorda. Na verdade as labaredas que ele estava sentindo eram brasas da lareira. Daí ele vai até o Jerry e o cobre de beijos – ante a surpresa e incredulidade do rato.

Agora, reflitam comigo, crianças: por que o Tom deveria ser condenado ao inferno por tentar comer o Jerry – no bom sentido, é claro? Ele é um gato! Gatos caçam ratos! O Jerry sim era um sádico. O que o Tom apanhava, meu Deus! Era panelada na cara, bigorna...isso quando não aparecia o Cachorrão Mau que defendia o Jerry.

Não vou nem entrar nos personagens perturbados tipo Gaguinho e Patolino. Adorava quando ele perdia o bico dele – e quando achava punha ao contrário, ou punha nas costas.

Mas do Donald eu preciso falar. Não, não vou entrar no já tão explorado fato do Donald não andar de calças, mas apenas de camisa e bla bla bla. Quero destacar um desenho específico. Um em que o Donald tem insônia por causa de uma torneira na cozinha que não pára de pingar. Ele faz de tudo pra torneira parar de pingar. E a torneira vazando. E as horas passando e ele ficando com os olhos vermelhos e tenso, pois afinal ele é um pato responsável! Precisava acordar cedo no dia seguinte, NÃO vestir as suas calças e ir trabalhar! Pensar no seu futuro com a Margarida. No sobrinhos Huguinho, Luizinho e Zezinho que, como a gente presume, deveriam ter pais ausentes porque eles viviam na casa do tio. E a torneira vazando...ploc, ploc, ploc...

Refletindo hoje em dia sobre o porquê desses desenhos terem ficado na minha cabeça com detalhes tão vívidos acho que é porque todos guardam uma dose de sadismo e repetição que seriam um aperitivo da vida adulta. Tomar na cabeça e não aprender. Continuar repetindo o mesmo erro. Um tentar e tentar pateticamente, enquanto um sádico aproveitador sempre vai rir de você.

Eu sou extremamente grata a esses desenhos, bem como as tirinhas do Calvin, um pouco mais tarde, e as porradas que a Xuxa dava nos baixinhos. Juntos, eles moldaram minha personalidade. Sou contra a idéia de que histórias pra crianças devem ter finais felizes e “moral da história”. Vocês sabem que a história da Chapeuzinho Vermelho na verdade é uma terrível história de sangue e morte, que o Lobo como a vovó e fica com a Chapéuzinho, né? Era assim na Idade Média. Aí veio o século XVIII e pasteurizou as coisas. Maldito Iluminismo.

9 comentários:

Patricia Fernando disse...

Carry, sabe que eu tbm sempre torci para pros "maus/oprimidos". Acho que isso tem a ver com a visão que temos de nós mesmos, não acha? Tipo, aqueles que torciam para os mocinhos, geralmente eram aqueles super bem "resolvidos", crianças minadas, egoístas e totalmente egocêntricas em que tudo que importava era eles e mais ninguém.

Ichi.. acho que tô viajando... voltando para a programação normal.. eu e o meu marido sempre usamos essa frase "e la vamos nós" quando estamos em uma situação de difícil situação! hehehheh

Anônimo disse...

Como uma criança dos anos 80, o Pica-Pau moldou meu (mau) caráter também. E continuo recheando meus diálogos com as falas do desenho ("Em todos estes anos nesta indústria vital, esta é a primeira vez que isto me acontece", "Vudú é pra Jacú!", "Chamando Doutor Hans Chucrutes.", "Marche!", "Não Consigo Ler Nada!", "Se o Pica Pau tivesse avisado a polícia, isso nunca teria acontecido.","Vou ver o psi..,squi, psqui..., vou ver o doutor!") Beijão!!

Anônimo disse...

Hahahaha. Adorei o post! Minha filha assiste pica-pau direto, e ontem msm passou o epsódio da bruxa e sua vassoura. No final ele não só ri sua risada diabólica como sai voando na vassoura da bruxa, enquanto ela tenta incansavelmente encontrá-la no meio de muitas... Muito mau esse pica-pau.

E como anda sua tese? E como anda NY??? Suas idas à biblioteca do futuro? A grega... sinto falta da grega...

Beijão enorme, Carrie!!!

Kaw

Anônimo disse...

Por que o Tom deveria ser condenado ao inferno por tentar comer o Jerry – no bom sentido, é claro? Ele é um gato! Gatos caçam ratos!

Ah, Carrie, como seria bom se as pessoas se fizessem essa pergunta também fora do contexto desenho animado... :)

Também nunca_gostei do Pica-pau, nem do Coiote, mas o desenho que mais me agoniava toda vida era o Pepe le Gambá. Ele agarrando a gatinha, ela tentando escapar... Muito perturbador pra uma criança do sexo feminino.

Anônimo disse...

Caraca, esses dois desenhos/episódios (a bruxa com as vassouras e a torneira pingante do Pato Donald) tão vívidas na minha memória como se eu tivesse visto ontem. ADORAVA. E esse episódio da bruxa rendeu frutos na minha família e quase levaram meu pai a cometer infanticídio: cada vez que eu e minha irmã entrávamos no carro, para ir a qualquer lugar, começávamos: e lá vamos nós... e lá vamos nós... e lá vamos nós... umas oitocentas vezes!!!! Era hilário. Até hoje, às vezes entro no carro de marido, quando vamos pegar a estrada, e falo: "e lá vamos nós..." Ai, Carrie, que lembrança boa que você me fez evocar.
Beijos grandes
Pati Linden

Anônimo disse...

Na verdade, o desenho que eu tenho na cabeça é aquele das cataratas que o povo levanta os braços antes da queda. Não me lembro os nomes mas o desenho ficou na cabeça... Karine

Carrie, a Estranha disse...

Hahahaha...pessoas! Vcs são muito engraçadas! Q ótimas lembranças!

Pil,

Na linha "frascos e comprimidos" eu adorava o Charlie Borwn. Bom, esse acho q é unanimidade, né...

Tak,

Eu tenho uma comunidade "vudu é pra jacu" (e tb outra pica pau lia Nietzsche). "Marche" é outro clássico. Bem lembrado.

Kaw,

Sério q vc viu ontem? Puxa!

Tese? Que tese? Hahahaha

Nervocalm,

Hahahaha...sim, Pepe La gambá (era esse mesmo o nome dele?). Hahahaha...era hilário! Ele era um gambá francês q achava q a gatinha era uma gambá tb...rsrsrsrs...muito bom!

Pat,

Ahahahaha! Pobre pai!

Karine,

Acho q era o pica pau, tb. Se eu não me engano era esse que ele vai pro Canadá e tem a tal frase "marche" q disseram aí pra cima.

Bjao

Ila Fox disse...

Anos 80 e suas coisas politicamente incorretas.. adooouro!

la vache qui rit disse...

só digo que "e lá vamos nós"!
;)