terça-feira, janeiro 29, 2008

Eu habito o Overlock


Eu já deveria saber que muito trabalho e pouca diversão fizeram de Jack um bobão. Quer dizer, em tese eu já sei, mas saber em tese é o mesmo que não saber; ou é como o saber psicanalítico: você acha que sabe, mas quando roda o espiral, e você vai pra outro anel e consegue ver o ponto onde estava, aí é que você percebe que não sabia nada e agora sim é que sabe. Pessoas confinadas em locais são capazes de atos tresloucados. Pessoas tipo eu, o Stephen King, o Jack Nicholson, o Conde de Montecristo e a Bel Seslaf não podemos ficar em casa o tempo todo, nem muito menos sozinhos num hotelzinho no meio da neve, por mais tentador que isso seja. Porque se deixar a gente fica. Ah, fica. Porque não há lugar melhor pra esse tipo de gente. O lugar funciona como um imã. De preferência entre livros, computadores, DVDs ou simplesmente olhando o teto. Ah, como eu amo olhar o teto. Uma das minhas maiores distrações é olhar o teto. Aliás, é justamente por ser o nosso habitat natural que a gente deve sair. Nem que seja pra ter saudades de casa. E, no meu caso, é particularmente pior porque eu moro sozinha. Eu, que já não sou muito chegada à convivência com o gênero humano, preciso me forçar um pouquinho todo dia. Sob risco de me tornar uma misantropa, na melhor das hipóteses ou uma sociopata, na pior. Mas é que eu tenho preguiça de gente. Não é nada pessoal, eu tenho os melhores amigos do mundo, a melhor família, eu gosto da minha vida, mas eu tenho preguiça. Tenho preguiça da realidade. Por isso o ambiente virtual calçou como uma luva para mim. É um contato íntimo, mas distante.

Eu estou conseguindo me conscientizar que o exercício é fundamental – pra esse tipo de gente tipo eu. Saber só é saber se é na prática, se ainda não funciona, você não sabe de verdade. E eu acho que agora eu realmente sei disso. Até o prezado momento fiquei só 4 dias sem malhar esse mês. O problema – ou a solução – é que eu tenho um minitrampolim em casa. Que era pra ser usado só em dias de chuva ou de muita animação. Como anda chovendo muito aqui no Rio, eu acabo fazendo até o exercício em casa. Tem dias em que nem o som da minha voz eu ouço. Assim não pode. Assim não dá.

Na rua eu sinto saudade dos meus objetos. Penso: “ahhhh, minha cama deve estar tão triste...”. É sério. Eu penso. Meu olhos chegam a encher d’água se eu estiver na TPM. E viajar, então? Viajar é um parto. Não porque eu não goste ou tenha medo do avião ou da estrada. Mas é uma dificuldade que eu tenho de sair de casa...mas aí quando eu vou é ótimo. Eu adoro, curto, mas quando eu chego em casa eu faço que nem o Chico Bento, depois de passear na cidade: “lá é bão, mas aqui é mió”. Eu me apego às situações. Eu funciono por inércia. Depois é difícil parar.

Quando eu era criança eu tinha pavor quando as minhas duas vizinhas, gêmeas, vinham me chamar pra brincar. Eu pedia pra minha mãe falar que eu não estava, não ia, porque...eu queria ficar em casa. Na minha. Quietinha. Com meus seres e brincadeiras imaginárias. Com meus jogos de tabuleiro. E elas queriam brincar de queimada, ficar na rua, andar de bicicleta. Mas aí tinha dias em que eu mesma me forçava a ir, afinal eu tinha que ser minimamente normal se não meus pais podiam mudar de idéia e me dar pra adoção. E aí eu adorava. Mas depois o sentimento voltava (já contei aqui sobre a vez que a empregada delas teve que me trazer no meio da noite pra casa, porque eu simplesmente não agüentava de saudades dos meus pais).

Então, eu preciso sair pra que a minha tese ande. Eu preciso ir à esquina comprar pão e jornal, eu preciso caminhar, eu preciso ir ao cinema que é a única coisa que minhas posses permitem, eu preciso visitar amigos, eu preciso me organizar para passar uma parte do dia fora de casa. Eu não vou pra uma biblioteca estudar, porque como eu estou na fase da escrita eu tenho medo de levar laptop e ser assaltada – e pra ficar indo e voltando de táxi, não rola.

Uma vez eu vi a mulher do Harry Potter dizendo que ela só escreve em cafés. Cafés não muito cheios a ponto dela se desviar da história pra ouvir o que a mulher da mesa ao lado está falando, mas também não muito vazios a ponto dela só ouvir o próprio pensamento. É foda você ficar só com o seu pensamento. Aí as idéias começam a ir embora...Cabeça vazia, oficina do capeta. Quando ela está sem inspiração deixa o laptop carregando a bateria e sai pra dar uma volta. Oquei, Londres não é o lugar mais seguro do mundo, mas fazer isso aqui no Brasil não dá.

E aí eu descobri o 34.769o motivo pra eu gostar do BBB: ele é igual a minha vida. Um monte de gente confinada num lugar que nada acontece com todo mundo olhando. Não é à toa que o cara que o Rafinha entrou no lugar não agüentou o confinamento do hotel, onde a pessoa fica 10 dias sem sair do quarto. Teve uma edição que um cara, um que era motoqueiro, pediu pra sair. Literalmente. Mas voltando ao meu cérebro, é a mesma coisa. Quando eu fico confinada em casa, eu sei que vai dar merda. Só que no meu caso a merda é dentro de mim, porque todas as pessoas estão dentro de mim. O que é um problema, porque eu acabo botando duas ou até três no paredão toda semana. Mas ao contrário da casa, elas não saem. Voltam e voltam mais fortes, prontas pra revidar em quem as emparedou. Às vezes até se multiplicam.

15 comentários:

Canimo disse...

Eu li você no blog da minha prima e agora escrevi o nome do seu blog direitinho no meu blog, tá?

Sua doida eu te liguei pra dar Feliz Final de Ano (desculpe, mas é só que consigo desejar). Mas você não atendeu. Será que quando viu o DDD pensou: seria daquela instituição de ensino?

Vou dar uma passeada por aqui enquanto seu lobo não vem, porque não apareço há muito tempo e hoje é dia de visita.

Beijo.

Andrea disse...

Saudade de gente como Dilsinho no BBB...hhohoho

Carrie...é melhor que MUITOS nos habitem, acredite. Bjs

Carrie, a Estranha disse...

Môooooonica,

Eu não vi a msg! Eu não te disse? Acho q eu te disse pelo msn. Eu estava em VR e eu escutei o cel (pq lá eu moro em Versailhes. Hahaha). Qdo fui ver tava lá a ligação, mas eu escutei o recado q vc deixou na caixa postal. Eu quero saber qdo q a senhora vai vir aqui?

Andreeeeeea,

Senti taaaanto a sua falta, Andrea! Só vc me entende! Só vc vê o BBB como eu!

Bjs

Unknown disse...

Carrie,

Adorei o texto, eu por mim tb so ficava em casa, mas os outros reclamam...

Alvaro disse...

Ficar em casa é muito bom! Recentemente editaram um livro cujo título é justamente "O Prazer de Ficar em Casa". Me fugiu agora o nome da autora, mas o espírito é bem esse mesmo...

Eu estive viajando nas últimas semanas. É bom, claro, mas a sensação de chegar em casa de volta foi muito gostosa!...

Saudades, Carrie!
Beijo, do
Alvaro

La Vita `e Troppo Strana disse...

Carrie querida do coracao...so sair para trabalhar nao serve??? eu nao vivo num casulo: eu sou o proprio casulo.... eu nao sou um urso imbernando:... sou a propria imbernacao...nao sou so estranha:... so uma alienigena mesmo...que fazer nao eh? imagina que eu, em plena Miami (como vc em pleno Rio) as vezes entro 6a. a noite em casa e saiu 2a. pela manha para o trabalho... depois acho um absurdo o que faco comigo mesma... no findi seguinte saio, vou a cinema, praia e... tenho recaidas de novo...nem Freud explica mais isso...beijos...Hetie
(PS.: q dificuldade para deixar este comentario hoje...nao consegui no office e quase q nao da certo aqui em casa tb... -consegui deixar um comentario para Hillary e nao conseguia deixar para vc...muito chique...) beijinhos...

Carrie, a Estranha disse...

Hetie,

Mas eu não saio nem pra trabalhar! Eu trabalho em casa!

Agora o sistema de comentários mudou (eu mudei). Precisa colocar a senha do google ou blogger ou criar uma.

Vc vota na Hilary? Eu sou Obama desde criancinha! Aliás, vc vota? No rep ou dem?

Bjs

La Vita `e Troppo Strana disse...

Sou Hillary. Sou Democrata... apesar de ser conservadora e os conservadores serem os republicanos aqui... deu para entender???
Estamos preparando a documentacao para a Cidadania... Bua... ainda nao vai dar para votar agora... so na proxima vez e espero q seja para reeleger a Hillary. Ela eh a mais preparada de todos, pelo menos eu acho... se der, de uma olhadinha no meu post de hoje... o Claudio eh republicano, mas convivemos bem, somos civilizados..ele votaria no Giulliani (que ja era) e sua 2a. opcao McCain
Beijinhos...

Karina disse...

De repente esse texto me fez lembrar do filme Identidade, com John Cusack; Ray Liotta; Rebecca De Mornay e outros.
Tbém amo ficar em casa, curtir o silêncio, olhar pro teto nem se fala. Ler seu blog é uma forma de me conhecer, sempre vejo por aqui algo q sempre faço, mas nunca paro pra pensar. :D
Bjinhos

Carrie, a Estranha disse...

Hetie,

Sim, sim. Eu manjo minimamente as posições políticas de democratas e republicanos. Mas eu continuo torcendo pro Obama.

Well, papa tinha que ser republicano. Se não ele não seria sobrinho de quem é (ih, olha só! Nem conheço o cara e já tô falando. Brincadeirinha!).

Karina,

Hahahahaha...esse filme é realmente muito, muito bom. Qdo vi tomei um sustaço! O q lembra tb Clube da Luta, outro filme q eu amo. Só espero q vc não ache q sou esqiuzofrênica! Hahah

bjs

Unknown disse...

Olha, tenha certeza q vc não está só. E mais: por um lado é uma privilegiada. Pq não tem q explicar isso todas as vezes q viaja com maridón. Explicar q até gostaria de viajar mais, desde q pudesse levar todos os móveis, de preferência a casa inteira. Ele me olha como se pensasse: "tadinha! doentinha,doentinha..." Odeio arrumar malas. Desarrumar? mais ainda. Odeio não saber se vou querer usar o sapato preto ou o marron, qdo um dos dois não cabem na mala e eu tenho q escolher antes de viajar. As vezes amo ficar em casa, mas tenho medo do tédio. Aí no outro dia, dou uma volta. Enfim me identifiquei mto com o seu texto, mas não curto BBB. Acho q é tudo combinado.
Beijos.

Anônimo disse...

Carrie, vc tem uma alma gemea que mora em Frankfurt. Quase ninguém entende o quanto eu gosto de ficar em casa, já fui chamada de "boring" pela minha sogra e cunhada. Tem dias em que nao tenho vontade de pisar na rua, adoraria ser compreendida (ou ao menos respeitada!).
Obrigada por me fazer sentir (ao menos um pouquinho) normal!!!

Canimo disse...

Eu sou uma maluca é claro que me respondeu!!!!
Lá no seu Palace o celular não pega! Beijos pra Versailles!

Carrie, a Estranha disse...

Jaqueline,

Ai, q chique vc. Eu não tenho marido, nem sapato preto ou marrom.

Mas eu te entendo, entendo.

Camila,

Ahahahaha...sorte sua estar em Frankfurt. Eu moro no Rio-40-graus onde todo mundo tem que ser animadíssimo sempre e no último bronze (odeio ficar queimada. Adoro ficar branca). Não se perturbe, irmã. O mundo ainda não está pronto para nós.

Mônica,

Em Versailles pega cel. O problema é q não dá tempo de eu correr pra atender! Dependendo em qual "ala" do palácio eu estou, entendeu? Hahahaha

Bjs

Canimo disse...

hahahahahahahaw.... Cuidado com a guilhotina Antoinette!!!!

Beijos.