segunda-feira, maio 28, 2007

A RCTV e o silêncio das esquerdas


Participo de algumas listas de discussão “de esquerda” que me mandam diversos manifestos contra ou a favor de um monte de coisas. Quase sempre recebo os mesmos textos duas, três vezes. Em geral, são abaixo-assinados ou petições de apoio à democracia, contra autoritarismos, a favor de movimentos sociais diversos. Na maioria das vezes eu concordo e até assino. Outras não são nem um pouco democráticas – pelo menos no meu entender -, como o link que eu recebi para ver “as verdadeiras notícias de Cuba”. (Nada, ninguém ou coisa nenhuma vai me convencer que é bom você viver sob uma ditadura – ainda que o argumento que venha em seguida seja sempre: “mas não vivemos em uma ditadura? A ditadura do Capital?”. Sim, vivemos. Mas eu prefiro essa à do Fidel. Acho perfeita aquela frase do Churchill: "Ninguém pretende que a democracia seja perfeita ou sem defeito. Tem-se dito que a democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos". Há quem veja nisso uma perspectiva liberal. Eu não).

Mas o que eu queria dizer com isso é que me espanta que em nenhuma dessas listas tenha aparecido nenhuma manifestação contra o fechamento da RCTV, rede privada venezuelana. Hugo Chávez, por considerar que a TV agiu na tentativa de derrubar seu governo – governo esse, ditatorial – fechou a rede. No seu lugar, mais uma rede estatal louvando Chávez e a sua “revolução bolivariana”.

Achei isso uma das coisas mais repulsivas de todos os tempos. E estranhei que não tenha havido nenhuma convocação nessas listas para nenhuma manifestação em frente ao consulado da Venezuela; nada, nada. Silêncio.

Lembrei-me de um trecho de “Os justos”, peça de teatro do Camus que eu li recentemente. Os personagens são socialistas revolucionários que se preparam para matar o grão-duque. Na hora H um deles titubeia, porque há crianças na carruagem:


Stepan: Não tenho paciência para essas patetices. Só quando nos decidirmos a esquecer as crianças, só nesse dia seremos os donos do mundo e a revolução triunfará.

Dora: Nesse dia, a revolução será odiada pela humanidade inteira.

Stepan: Que importância tem, se a amarmos o bastante para a impor à humanidade inteira e a salvar de si mesma e da escravatura?

Dora: E se a humanidade inteira rejeitar a revolução? E se o povo, por quem lutas, recusar que os seus filhos sejam mortos? Deveremos matar, mesmo assim?

Stepan: Sim, se for preciso, e até que o povo compreenda. Eu também amo o povo”.



Ou seja, a esquerda ama mais o povo e o entende mais do que a direita e em nome disso pode fazer qualquer coisa. Até fechar uma rede particular de televisão (mas com certeza a esquerda deve ter alguma teoria conspiratória sobre o fato, que não é bem isso e blá blá blá). Até matar. Até a revolução. Mesmo que o povo não queira. É a velha idéia de que o povo é uma criança, não sabe o que faz e precisa ser conduzido. É a vanguarda revolucionária que deve dirigir a massa. Alguma diferença do discurso da direita? Em "fazer o bolo crescer para depois dividi-lo"?

Sinto dizer que no Senado a única pessoa que se manifestou contra o fechamento da RCTV foi o...Sarney (!!!).

Esse mundo...vocês sabem. Não me pertence. Nem o da esquerda, nem o da direita.

3 comentários:

Sérgio Mayor de Andrade disse...

Comunista é elitista, mesmo. Pensar que um operário fabril do século XIX (ou XX ou XXI) sem instrução poderia alguma vez entender Das Kapital é pura fantasia. Em hora de lucidez noturna, eu assumo-me como Euro-Lefty. Sou um pseudo-anarca-esquerdista que se afirma contra a grande política e o grande capital mas sente-se hipocritamente bem num país democrático, capitalista e ocidental.
E Chavez já perdeu a piada há muito.

Canimo disse...

Viva Latinoamerica!!!!!!

O que cai lá no mundo velho a gente fica experimentando aqui , nesse atraso gostoso de praia, samba e futebol.

Em verdade, em verdade vos digo, nem toda esquerda é a solução, nem todo governo merece oposição.

Mas no caso desse quase nosso padrinho de governo, intimus gel do nosso lechvalessa moreno, é de matar.

Sei lá o que dizer: Solidarnosc??
Help ?? Was?

Carrie, a Estranha disse...

Boa, boa!!!

Sábias palavras