sexta-feira, fevereiro 23, 2007

Declaração de amor

(Quem conheceu meu pai pode constatar a semelhança. Esse aí é o Rubem Fonseca)



Eu sonhei com o Rubem Fonseca essa noite. Dizem que é comum as pessoas sonharem com as suas teses. Na minha dissertação de mestrado eu sonhava com Nelson Rodrigues.

No meu sonho dessa noite o Zé Rubem (nós, os íntimos, o chamamos assim) estava sentado no escritório do meu pai, lá na minha casa de Volta Redonda. E o meu pai, que morreu há quase 6 anos, estava vivo. E mesmo ele estando na minha casa, eu ficava com muita vergonha e pedia pro meu pai: “pai, vai lá, fala com ele, me apresenta”. Nesse momento o sonho acabava.

Não precisa ser nenhum Freud pra entender o que todo esse sonho significa. Rubem nasceu no mesmo ano que meu pai: 1925. Ele, no dia 11 de maio (título de um de seus contos); papai, 27 de outubro. Assim como meu pai, ele também é um esportista. Assim como meu pai, descende de portugueses. Assim como meu pai, estudou na faculdade que mais tarde seria incorporada a UERJ – ele, direito; papai, medicina. Formou-se em 1948. Papai deve ter entrado essa época na faculdade, pois se formou em 1955. Talvez tenham se esbarrado de leve nos corredores. Assim como papai ele é careca.

Hoje, lendo o blog Blowg, (da moça que é bipolar e lançou um livro sobre isso), eu vi uma imagem escaneada de uma dedicatória pra ela, do Rubem, no livro “Agosto”. Ela tem um amigo que é amigo do Rubem e pediu um autógrafo. Entregou o livro pro amigo e dentro pôs um bilhete: “Por que você matou o Comissário Matos?”. Ele respondeu algo do tipo: para fulana, com um pedido de desculpas por ter matado o Comissário Matos (e a Salete).

Babei de inveja. E fiquei com ciúmes. Sim, eu tenho ciúmes do Rubem Fonseca. Porque ninguém pode amá-lo mais que eu. Ninguém conhece tanto e já leu tantas vezes a obra dele. Eu tenho a pretensão – dessas que todo grande artista desperta na gente – de que ele escreveu os livros dele pensando em mim. De que só eu o compreendi realmente em todo o planeta.

Eu sei de fatos da vida dele que até ele se esqueceu. Sei que ele detesta cebola e escargots e tem pavor de engordar – o que lhe fez ser um esportista. Sei que ele tinha uma babá que o levava pro cinema, em Juiz de Fora, porque ela namorava o lanterninha (ou bilheteiro, já encontrei as duas versões). Sei das lendas que saem a respeito dele. Que ele já teria sido camelô. Mentira. Sei que ele é um dendrólatra e protege um Ipê na praça Antero de Quental, no Leblon. Sei que ele fez mestrado na Boston University e obteve o conceito Magna Cum Laude. Sei que ele estudou Administração de Empresas em Nova York. Sei que ele se formou como o segundo da turma na Escola de Polícia. Sei que ele viu a queda do Muro de Berlim ao vivo. Tinha ganhado uma bolsa do governo da Alemanha Ocidental. Foi entrevistado pelo jornalista da Globo que não o reconheceu e apresentou-o como “José, um brasileiro em férias na Alemanha”.

E infelizmente sei que ele odeia, mais do que tudo, publicidade, celebridade e dar entrevistas. Nunca deu em toda sua vida. Só quando está no exterior.

Sei de fatos que ele prefere esquecer. Nenhuma trajetória é 100% coerente. Os homens de verdade são contraditórios. E é isso que eu queria mostrar na minha tese. Um homem de verdade. Porque as histórias sempre vão vir à tona. Então é muito melhor que sejam escritas por quem consegue enxergar as contradições e grandezas.

Eu estou tentando falar com ele. Passei um e-mail, mas ele me ignorou. Um e-mail todo formal e tal. Tô pensando em mandar esse post pra ele. Ou escrever um e-mail do jeito que eu sei ser: direta e passional. Pode ser que ele me ache uma louca, mas o que eu tenho a perder?

É claro que a minha tese não depende disso. Eu trabalho com fontes, dados. Eu só precisava conhecê-lo. Conversar um pouco com ele. Minha tese se tornaria humana.

Eu só tenho medo de, chegando perto dele, minha boca trave, minha garganta seque e eu não consiga falar absolutamente nada. Chegar perto dele seria chegar o mais perto de uma das pessoas que eu mais admiro no mundo. Uma pessoa em quem eu me espelho, literariamente falando. Um dos poucos gostos que eu conservo desde a adolescência.

É...mas às vezes amar não basta.

Sei lá. Acho que estou ficando mentalmente perturbada. Vou enlouquecer e sair com "Vastas Emoções..." debaixo do braço gritando Zé Rubem, Zé Ruuuubem!!!

7 comentários:

e. disse...

Oi Electra!

Carrie, a Estranha disse...

rsrsrsr...

anouska disse...

você tem sorte. eu se quiser entrevistar meu "alemão" (wittgenstein era austríaco, mas russel o chamava carinhosamente por esse apelido...) vai ter que ser num centro de mesa. insista mesmo, dou a maior força. você não tem nadica a perder. e eu estou plenamente convencida de que o tempo em que se faziam teses na nossa área com a pretensão de objetividade "pseudo-científica" (o que implica o distanciamento do autor) já era. uma tese mais humana: é totalmente por aí, faço corinho contigo. não é ótimo ter uma paixão na vida e achar que ela nos basta? ah, eu não fiquei rica vendendo herbalife, mas sou uma pessoa feliz (e isso tb não é sacanagem, é seríssimo!)

=] bjs, moça.

Anônimo disse...

meninas: (voces sao otimas!): Eu tambem te dou a maior forca! Sua boa nao vai travar nada e voce vai ficar muito feliz com o resultado humano de tudo. Hetie

Anônimo disse...

Tomara que vc consiga falar com ele!!estou torcendo.
Quem foi esse jornalista, oh God?

Anônimo disse...

Ele está hoje no jornal, né? Todo serelepe, dizem, em Israel.
Eu também gosto muito. Li aquele tijolo dos Contos Reunidos (capa dura) no meu aniversário de 18 anos e fiquei assim uau. Desde então virei fã.

Anônimo disse...

quando eu tava escrevendo minha monografia, sonhava até com Paulo Freire (meu ídolo), mesmo que a dita monografia "nada" tivesse a ver com ele.