sábado, fevereiro 28, 2009

Os mais belos inícios de livros - parte I


“Chamai-me Ismael. Faz alguns anos – não importa quantos, precisamente -, tendo na bolsa escasso ou nenhum dinheiro e nada que particularmente me interessasse em terra, achei que devia velejar um pouco e ver a parte aquosa do mundo. É um hábito que eu tenho, para acabar com o esplim e regular a circulação. Sempre que começo a ficar austero; sempre que é um novembro úmido e chuvoso em minha alma; sempre que dou comigo a parar involuntariamente diante de empresas funerárias e a cerrar filar em cada enterro que encontro; e especialmente sempre que minha hipocondria adquire tal domínio sobre mim que é preciso um sólido princípio moral para impedir-me de sair deliberadamente para a rua e metodicamente surrar as pessoas – então acho que está na hora de ir para o mar o mais depressa possível. Este é o meu sucedâneo para a pistola carregada. Com um floreio filosófico, Catão se atira sobre a espada; eu calmamente vou para o navio. Não há nada de surpreendente nisso. Quase todos os homens (soubessem eles), qualquer que seja a sua classe, uma vez ou outra compartilham comigo quase que os mesmos sentimentos para com o oceano (grifos meus)”


(MELVILLE, Herman. Moby Dick ou A Baleia. Capítulo I. “Miragens”. São Paulo: Editora Abril Cultural. Coleção “Os imortais da literatura universal”, 1972, p. 25).


E vocês, quais são os mais belos inícios de livros que vocês conhecem?

12 comentários:

Anônimo disse...

Era o melhor dos tempos, era o pior dos tempos, era a idade da sabedoria, era a idade da tolice, era a estação Iluminada, era a estação da Escuridão, era a primavera da esperança, era o inverno da desilusão, tinhamos tudo diante de nós, nada tinhamos diante de nós, iamos todos direto para o Céu, iamos todos direto na outra direção..
Uma estória de duas cidades - Charles Dickens

Anônimo disse...

O mais bonito pra mim é:
"Era inevitável: o cheiro das amêndoas amargas recordava-lhe sempre o destino dos amores contrariados. O doutor Juvenal Urbino sentiu-o assim que entrou na casa, ainda mergulhada em penumbra, onde fora de urgência
para tratar um caso que, para ele, já tinha deixado de ser urgente há muitos anos. O refugiado antilhano, Jeremiah de Saint-Amour, inválido de guerra,
fotógrafo de crianças e o seu mais tolerante adversário de xadrez, tinha-se posto a salvo das inquietações da memória com um defumador de cianeto de ouro" (O amor nos tempos do cólera, Gabriel Garcia Márquez)

Anônimo disse...

Mas o mais legal é:

"Você vai começar a ler o novo romance de Italo Calvino, 'Se um viajante numa noite de inverno'. Relaxe. Concentre-se. Afaste todos os outros pensamentos. Deixe que o mundo a sua volta se dissolva no indefinido. É melhor fechar a porta; do outro lado há sempre um televisor ligado. Diga logo aos outros: 'Não, não quero ver televisão!'. Se não ouvirem, levante a voz: 'Estou lendo! Não quero ser perturbado!'. Com todo aquele barulho, talvez ainda não o tenham ouvido; fale mais alto, grite: 'Estou começando a ler o novo romance de Italo Calvino!'. Se preferir, não diga nada; tomara que o deixem em paz.

Carrie, a Estranha disse...

Ótima lembrança, Joel!!! Muito bom! Realmente poucos batem esse!
Vergonhosamente eu nunca passei deste parágrafo.


Luís,

Puxa...realmente o Gabriel Garcia Marquez é imbatível nos começos, mas, vergonhosamente nunca li "O amor...", embora até tenha aqui em Versailles.

Esse livro do Italo Calvino eu li e gostei bastante. Mas não me lembrava do título.

Carrie, a Estranha disse...

Não me lembrava do começo, eu quis dizer...

Anônimo disse...

Os começos do Gabo são imperdíveis mesmo. O do "cem anos..." também é ótimo, até porque é retomado muitas e muitas páginas depois.

Ele mesmo falou (acho que em "Cheiro de Goiaba") que o trabalho do escritor no romance se resume à primeira frase. É ela que define o que será o livro. O resto seria apenas prazer de escrever.

Amana disse...

"– Nonada. Tiros que o senhor ouviu foram de briga de homem não, Deus esteja. Alvejei mira em árvores no
quintal, no baixo do córrego. Por meu acerto. Todo dia isso faço,
gosto; desde mal em minha ocidade. Daí, vieram me chamar. Causa dum bezerro: um bezerro branco, erroso, os olhos de nem ser – se viu –; e com máscara de cachorro. Me disseram; eu não quis avistar. Mesmo que, por defeito como nasceu, arrebitado de beiços, esse figurava rindo feito pessoa. Cara de gente, cara de cão: determinaram – era o demo. Povo prascóvio. Mataram. Dono dele nem sei quem for. Vieram emprestar minhas armas, cedi. Não tenho abusões. O senhor ri certas risadas... Olhe: quando é tiro de verdade, primeiro a cachorrada pega a latir, instantaneamente – depois, então, se vai ver se deu mortos. O senhor tolere, isto é o sertão. Uns querem que não seja: que situado sertão é por os campos-gerais a fora a dentro, eles dizem,
fim de rumo, terras altas, demais do Urucuia. Toleima. Para os de
Corinto e do Curvelo, então, o aqui não é dito sertão? Ah, que
tem maior! Lugar sertão se divulga: é onde os pastos carecem de fechos; onde um pode torar dez, quinze léguas, sem topar com
casa de morador; e onde criminoso vive seu cristo-jesus, arredado
do arrocho de autoridade. O Urucuia vem dos montões oestes.
Mas, hoje, que na beira dele, tudo dá – fazendões de fazendas,
almargem de vargens de bom render, as vazantes; culturas que
vão de mata em mata, madeiras de grossura, até ainda virgens
dessas lá há. O gerais corre em volta. Esses gerais são sem
tamanho. Enfim, cada um o que quer aprova, o senhor sabe: pão
ou pães, é questão de opiniães... O sertão está em toda a parte."

nossa, eu fico sem fôlego sempre que releio. E é só o começo...
Guimaraes Rosa, Grande Sertao: Veredas

Paula Clarice disse...

Pra mim, Memórias Póstumas de Brás Cubas, que começa já mostrando toda a ironia que vai dar o tom do livro, ao dedicar suas memórias ao verme que primeiro roeu seu cadáver.

Pablo disse...

Olá!
Vi seus comentários no blog do Miscow e cheguei aqui.

BEM, concordo com o Miscow que os começos do Gabo são incríveis. Como tenho lido pouco, muito pouco, quase nada (sejamos sinceros: eu não tenho lido nada que não seja técnico), não vou tentar puxar da memória aqui, se não a coisa pode até entrar em colapso.rs

É isso. Gostei do blog! Voltarei mais vezes.
Beijos,

Carrie, a Estranha disse...

Oi Pablo!

Obrigada! Volte sempre! O q são os seus textos técnicos? De que área?

Paula Clarice, a menina do nome engraçado e minha revisora!

Bem lembrado. Constará nos autos.

Bjs, quinças.

Anônimo disse...

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André disse...

Para mim, o ex-libris dos inícios de livros, é o do Mazurca Para Dois Mortos, de Camilo José Cela:
"Chove mansamente e sem parar, chove sem vontade mas com uma infinita paciência, como toda a vida, chove sobre a terra que é da mesma cor que o céu, entre verde suave e cinzento suave, e a linha do monte já há muito se apagou."