terça-feira, janeiro 06, 2009

Aqui jaz


Atividades artísticas/intelectuais assemelham-se muito mais com o cultivo de plantas e animais do que se supõe. Não é à toa que a palavra “cultura” tem sua origem na cultura animal ou vegetal – o cultivo da soja, do milho; a criação de porcos, de galinhas. Apenas muito recentemente na história da humanidade – século XVIII – o sentido metafórico de cultura se torna usual. Assim como cultiva-se milho, se cultivam mentes (ver Raymond Williams, váááários livros, inclusive um que se chama "Cultura").


Ter um blog é como ter um jardim. Aliás, melhor seria dizer que escrever é como jardinagem. Talvez essa não seja a metáfora mais adequada, pois eu não entendo nada de jardinagem... Nem de escrita - dirá o leitor sarcástico.


As idéias surgem como sementinhas. Podem florescer ou não, dependendo do cuidado que você despende a elas. Para que a semente brote é preciso que o solo esteja saudável, fértil e arado. Depois é preciso acompanhar o crescimento da planta.


Um blog não pode ficar abandonado. Você tem que cuidar. Formiga Irmã diz que tem horas em que eu venho aqui e abro a janela, deixo entrar o sol, varro a casa, sirvo cafezinhos, faço sala e apresento pessoas. É mais ou menos isso. É o olho do dono que engorda o gado. É preciso ver se não está crescendo ervas daninhas. Se não há invasores. Jogar aguinha. Podar. E cuidar da grama. Um blog é um jardim com grama, basicamente. De vez em quando há algumas flores mais nobres, uns xaxins com plantas, mas o dia a dia é a grama. Você precisa cuidar pra que a grama esteja sempre certinha. A grama são os posts do dia a dia. A calça-jeans-com-camiseta-branca. Embora nem sempre surpreenda, é uma escolha confortável e acertada. Vai mais ou menos agradar muita gente – ou pelo menos não desagrada a tantas.


As pessoas me perguntam (ra ra. Os fãs que que me perseguem pelas ruas, né?): nossa, mas como você consegue atualizar o blog diariamente? E eu digo: mas eu não escrevo nenhum Ulisses. Tudo o que eu coloco é grama. Escrevo como quem cuida de um jardim ou de uma horta. Às vezes o trabalho é só capinar. Uma vez ou outra há uma samambaia chorona – bem chorona – ou até uma orquídea. Cactos. Muitos cactos que machucam quem não conhece meu jardim. É que meu jardim tem um mapa que fica bem na entrada dele. Pouca gente consegue ler.


Todo texto passa por um processo de amadurecimento. Alguns amadurecem ainda na cabeça, só precisando ganhar forma. Outros são publicados, mas serão eternas crianças: nunca amadurecerão. Fico eu a correr atrás deles pela casa, com a mão na cabeça, dizendo “esse menino não tem jeito!” ou simplesmente rindo quando ele faz alguma palhaçada. Há ainda aqueles textos que apodrecem. Vêm à tona ainda frescos mas, por algum motivo, apodrecem depois de publicados. Quem os come passa mal.


Há ainda textos que eu escrevo e deixo guardado. Eles ficam em uma gavetinha, calados, sentados em uma prateleira, junto com minhas bonecas, esperando qual será o destino deles. As vezes apodrecem e realmente vejo que o destino era o lixo. Nem por isso foram menos inúteis. Pelo menos não apodreceram dentro de mim. Serviram como adubo. Em outras, ficam pulando e me atazanando a vida. Dizendo “aqui, ó! Lembra de mim, lembra de mim, por favor!!!”. Aí eu mexo aqui, mexo acolá e ele fica pronto pra ser publicado.


Tudo isso pra dizer que resgatei um antigo texto, achando que ele seria dessa categoria mas não era - têm isso também: textos são temperamentais e nos enganam. Coitado. Nasceu morto.

Tem um tema que eu venho escrevendo e reescrevendo e nunca consigo publicar. O texto morre antes. Paciência. Escrever é também, dentre as inúmeras outras coisas, exercer uma virtude que eu tenho pouquíssimo: a paciência consigo mesmo.

Um comentário:

Ila Fox disse...

E vc acabou de escrever um belo girassol. ;-)