quarta-feira, janeiro 23, 2008

As regras do jogo


O que mais me fascina no Bigui Bróder – bom, difícil dizer o que mais me fascina além das pérolas proferidas pelos participantes, dos corpinhos sarados dos meninos e das meninas e de me inteirar das moda do país – é o caráter de imprevisibilidade do programa.


Nas primeiras edições, cujo vencedores foram pessoas simples (Bambam e Cowboy), disseram que o povo vota em gente simples. Aí veio o Dhomini, um maluco que tinha uma seita própria – um pouco fora do padrão. Aí veio a moda de entrarem pessoas que eram sorteadas por telefone e que começaram a ganhar porque eram fora do padrão bebebístico de modelo-aspirante-a-atriz. Mara e Cida ganharam. Pronto. Estava estabelecido um padrão de vencedores. Aí o próprio programa acabou com essa regra.


O ganhador seguinte foi um homossexual, feio e professor universitário – até de origem simples, mas outro padrão. A sociedade brasileira, machista, preconceituosa, tinha dado o prêmio para um gay. Isso é histórico. Inédito. Daí veio o Alemão. Homem, bonito, hetero, classe média e, pior, ele sequer tinha feito a inscrição como todo mundo; o cara foi escolhido.


Carisma? Pode ser. O Marcelo, Psiquiatra e Gay, tenta um jogo arriscado. Assumiu a homossexualidade, é carismático, mas é também mala. Metido a sabichão, dono da verdade e, ao contrário do Jean, não assumiu a boiolice pra casa. Tá chamando um por um e contando. Mas, porra, se ele conta pros que tem mais intimidade, como explicar que ele tenha contado pro Rafinha e votado nele? (eu acho que o Bial não vai com a cara dele).


O bosta do Felipe, o cota negra do programa, não sai porque é tão insignificante que ninguém o nota. Assim como Biancão. Não dá nem pra ter raiva. Isso é a pior coisa. Ela se apresentou como o perfil "diferente" e "alternativo" da casa, provando que quem vê cara não vê coração. E o dela é mais careta do que o da maior das patricinhas.


A estratégia da casa agora é indicar os mais fortes – Gyselle e Rafinha. Engraçado é que eles conseguem perceber quem são os fortes, mas não se aliam a eles, né? E com o Rafinha ficando aposto que vão tentar botar os dois no paredão. Só que vão se fuder, porque essa semana serão três os indicados. E os dois vão ficar. E vai se repetir a saga Grazi-Jean-Pink ou Alemão-Fani-Iris. Ou não. Porque não há regras.


O que me impressiona também sempre é as pessoas ainda acreditarem que “estão sendo elas mesmas” e que “falam na cara” (odeio gente que fala na cara. Isso é desculpa de mal educado. Mentiras sinceras me interessam). Como se fôssemos todos indivisíveis, completos, fechados, unos e coerentes. Como se pudéssemos nos conhecer por completo – é o que eu dizia hoje, Bellinha: psicanálise não é auto-conhecimento. No máximo conhecimentos parciais e provisórios sobre partes da sua existência. Somos papéis sociais que desempenhamos em determinadas situações, o que dirá em um programa em que se sabe que tudo é filmado. Mas aí já é pedir muito pra eles, né? O senso comum acredita na verdade sobre as pessoas. Em esclarecer os fatos, em se conhecer, se entender. E dizer que “estou sendo eu mesmo” também é uma ótima estratégia. Em tese. Porque na teoria a Jegueline fez isso e se fudeu, a Thalita fez e tá se fudendo. Porque não há regras.


E o que foi a justificativa do Rafael Galego? “Eu sabia que estava fazendo um jogo que não agradava as pessoas, que não agradava aos editores do programa”. Aí o Bial mandou muito bem mandado: “pô, mas você achou isso um bom jogo?”. Porque, na boa, pra que ir pra um programa desses e não fazer o que o público quer, querer “ficar na dele”, pra que ir? E mais: não foi por isso que ele saiu. Ele saiu apenas porque o Rafinha é muito forte. O cara é entregador de verdura, gente. O outro estudante de medicina. Perguntado sobre se ficaria triste em sair Galego diz: “vou continuar minha vida normal”. Perguntado sobre se trocaria a medicina pela carreira artística ele respondeu “nunca, já escolhi a minha arte”. Como disse o Bial. Se perdeu a linha do desejo. Tem que ir no prêmio como quem vai num prato de comida. Mas também poderia ter funcionado. Porque, vocês sabem, não há regras.


E foi fofo ver o Rafinha falando – no pedacinho que passa no Multishow – que vai casar com a “mina” dele, agradecendo as pessoas que foram...dizendo que nunca tinha passado por nada parecido. Isso eu acredito que seja realmente um lampejo de conhecimento sobre si. Porque muita gente ali nunca passou mesmo por nada parecido. Nunca teve a família toda reunida em torno de um objetivo. Nunca foi um atleta, um aluno exemplar. Nunca foi bom em nada.


Eu tô achando esse BBB o que as pessoas estão mais descontroladas. Cada formação de paredão, cada eliminação, é um parto. Choram, se abraçam. Como se não soubessem que teriam que passar por isso e como se a vida aqui fora não continuasse. Como se estivessem passando férias na casa de praia. Talvez cada vez mais as pessoas saibam o quão efêmera é a fama do BBB. O programa tornou-se metanarrativo. O conhecimento prévio ajuda a se movimentar na casa. Apesar do Alemão nunca ter assistido a um BBB.


Chora-se por tudo. Por quem sai, por quem fica. Como todo choro, chora-se mais por si do que pelos outros. Porque o BBB é uma metáfora da vida – dãã, sei que é um clichezão, mas vamos lá. Pra mim a graça do BBB não é ver, segundo Guy Debord, a espetacularização da vida cotidiana (quando eu dava aula de monografia 9 entre 10 alunos queriam fazer monografia sobre o BBB e sempre dizendo isso); a midiatização vida real; a mistura das esferas pública e privada, o retrato do Brasil... Voltando ao papo de ficção que eu falava no post de ontem sobre a novela, e que no fundo é o que eu trabalho na minha tese, (sorry, chega um ponto em que você enxerga sua tese em tudo a sua volta), a arte, a cultura de massa (ou indústria cultural, como preferem os frankfurtianos da primeira geração) ou a superestrutura não são um reflexo da realidade, de forma direta ou indireta, uma conseqüência espelhada da infra-estrutura, como dizem os marxismos tacanhos. O BBB é, também, a realidade. É um microcosmo no qual se coloca uma lente de aumento. Torta, idealizada, unilateral, com mocinhos e vilões (que na verdade não passam de edição: no programa, dos editores; da vida, quando a gente culpa o outro ou quando não consegue mostrar outros lados de si mesmo), com gente injustiçada, gente boa saindo cedo demais e gente ficando até o fim sem merecer. O BBB é um jogo sem regras. Sem previsão. Algumas pessoas decodificam melhor os signos e conseguem fazer uma leitura. Como a vida. Acreditar, ter fé e querer pode funcionar. Mas também não pode. Há a sorte. O acaso. O aleatório. Porque vocês sabem. Elas, as regras, não existem.


3 comentários:

Stella disse...

Menina, antes de comentar esse post (que eu ia comentar no outro, mas você atualiza muito rápido, meodeos!) queria te dizer uma coisa. O comentário dessa menina me deu uma senhora coragem de comentar aqui também. Sei lá, pode parecer idiota, mas sou muito fã sua. Tenho pelo menos uns 10 amigos que também entram aqui e não comentam (como eu), mas adoram! Acontece que eu não sou muito boa com essas coisas de comentar, então, hoje, quando vim fazer minha visita diária ao seu blog e li o que a Ana escreveu, resolvi comentar e dizer que você tem outra pessoa que te admira muito, mesmo sendo bem mais nova e ainda na graduação (faço letras na uff). Outra coisa muito estranha, foi que depois de meses lendo seu blog, descobri que você conhece a Cris, que é minha professora na faculdade! E que também tem um blog muito legal que eu não comento pelo mesmo motivo - vergonha.
Okaaaay, dito isso (ou desabafado isso?) posso comentar o BBB.
Minha mãe é viciada, eu já não ligo tanto, mas me divirto muito lendo o que você escreve sobre o programa. Aquilo que você disse sobre o Rafinha parecer um menudo foi hilário! Tenho a impressão que esse programa já está saturado. Por mais que os vencedores mudem e nem sempre seja a mesma coisa, acho que é uma fórmula que já cansou. Tanto que a própria Globo faz questão de fazer mudanças no programa toda hora. Isso de colocar um telefone que pode tocar a qualquer momento (musiquinha de suspense!) foi uma dessas tentativas de animar aquilo lá. Eles precisam é de um barraco bem dado. Hahaha... pois é, brasileiro se amarra num drama. E eu sou brasileira também, então não fujo à regra.
Acho que esse comentário está muito grande. Então é melhor ir antes que não tenha caracteres suficientes pra dar tchau!

é, tchau! Beijos

Carrie, a Estranha disse...

Coragem pra comentar, Stella? Assim eu me sinto até a Madonna! Hahaha...

Muito obrigada pelos elogios todos. Puxa. Fico muito feliz. E obrigada aos seus amigos q tb leem e não comentam - vamos ver se agora eles "tomam coragem" tb. Rsrsrs...eu não mordo. Só sob pressão.

Qto ao BBB, eu acho q o formato vai se esgotar, mas ainda está longe.

Bjs e vê se comenta mais então!

anouska disse...

ei, essa é a minha aluna! agora eu acredito MESMO que só existem três pessoas em niterói...

e sobre o que você disse sobre regras eu discordo um pouco. wittgenstein tem uma visão muito interessante sobre essa questão de regras. um dia eu posto lá no blog.

menina, adorei minha qualificação. até postei lá no blog. tô in love total com a minha tese. como diria bellinha: yupiii!

=]

bjs