segunda-feira, outubro 15, 2007

Rehab now!


Então, Bial. Acontece que se até a Paris , a Britney , a Amy
e a Lindsay fazem desintoxicação de vez em quando – nem que seja pra agüentar a próxima enfiada de pé na jaca – eu também vou me desintoxicar. Preciso dar um tempo nas drogas mais pesadas, como o chocolate e a cerveja e porcarias em geral, antes que eu saia rolando pela rua, ou precise de um transplante de fígado, ou ser retirada pelo corpo de bombeiros de guindaste da minha casa, após quebrar as paredes e com os vizinhos olhando espantadíssimos.- ou todas as anteriores.

E o melhor é ouvir as pessoas dizendo: “ah, mas você nem está tão gorda assim...” – o subtexto que esse “nem”, “tão” e “assim” revelam é: “ah, você está gordinha, mas ainda dá pra piorar muito”. Mas esse é o problema do gordo: ele não pára. Até o Jô Soares precisa, de vez em quando, fazer uma dietinha básica só pra perder uns 20 quilos – até pra ter onde engordar. Se a parada estacionasse, beleza. Mas quando se pensa como gordo, o céu é o limite. E ninguém chega aos 100 quilos de uma hora pra outra. É um quilinho aqui, outro ali e assim vai.

O gordo – ou alguns tipos de gordo - é que nem alcoólatra: ele nunca pode dizer que está curado, ele é um eterno viciado em comida que precisa estar sempre alerta e vigilante para o perigo que se esconde atrás da coxinha mais próxima. O gordo é um alcoólatra do sólido – mas, ao contrário deste último, não pode se dar ao luxo de se privar de sua droga por completo; tem que conviver pacificamente com ela; estabelecer um pacto de não agressão; manter a estabilidade em uma Guerra Fria, onde as duas potências sabem da força que a outra têm e por isso não se provocam. E com relação a certos alimentos o único caminho é não dar a primeira mordida.

“Nossa, que exagero” já posso até ouvir aquele leitor ali do canto. Exagero porque não é com você, caro amigo. Só quem oscila de peso com freqüência sabe o que eu falo. Só quem já alterou 17 quilos num curto espaço de tempo - como eu - sabe (a leitora tomando seu chá verde fez que sim com a cabeça). E o pior é isso: a gordura nem é um problema digno. Há um certo charme – ainda que torto - em ser um viciado em drogas ou bebida. Muitos astros do rock e do cinema são. Ser gordo – ou viciado em comida – é tido como falta de vergonha na cara. O gordo é, antes de tudo, um safado. Um fraco que não tem capacidade nem de gerir o seu próprio corpo, que dirá sua vida. Alguém que não merece crédito.

Muita gente não deve estar entendendo o que é “ser viciado” em comida. Ser viciado em comida é comer pra se livrar dos problemas. É comer até passar mal. Mas não é atacar uma caixa de bombons ou exagerar no almoço de domingo, é realmente comer uma quantidade que qualquer outra pessoa “normal” não conseguiria em um curto espaço de tempo muitas e muitas vezes. É comer uma coisa quando está na frente dos outros e outra quando está sozinho. É não ir à praia, não sair à noite, não fazer uma série de coisas porque acha que todo mundo vai estar olhando. Mas ninguém entende isso. Até dentro dos distúrbios alimentares a compulsão fica em segundo plano. Anorexia e bulimia são tidas como mais graves. E, de fato, são - principalmente a anorexia, pois a pessoa vai indo desmaia de inanição e morre. A compulsão é tida como uma questão de auto-controle. Mas não é. E os problemas psicológicos decorrentes disso são inúmeros e todos muito graves.

Começar a mudar é relativamente fácil. Difícil é manter as mudanças. Relacionamentos, cursos, exercícios e outras práticas podem ser fáceis de começar. O complicado é mantê-las. Não ter vontade de jogar tudo pro alto e sair correndo – não que às vezes não seja preciso jogar tudo pro alto e sair correndo. Por que alguns de nós tem comportamentos auto-destrutivos, mesmo sabendo que existe um jeito muito melhor de se viver? Não sei, mas tenho algumas hipóteses bem gerais. Acho que é por essa sensação de controle-descontrole que chega a dar vertigens. É muito ruim perder o controle em tudo na vida, mas ter o controle é melhor ainda. E pra você ter o controle, você precisa perder. Mas o problema é justamente esse: achar que há um controle. O difícil é manter a “atenção” (vejam que é diferente de “controle”) o tempo todo sem que pareça que você é uma corda de violão super hiper esticada. Difícil é ter a medida entre o retesar e o afrouxar. Difícil é como diria Buda percorrer o Caminho do Meio. Os extremos se parecem mais do que se contradizem. É como percorrer um caminho pendular, onde a cada momento se está em uma ponta, igualmente alta e vertiginosa, pra depois cair – e eu sempre tive medo de pêndulos, desde a infância. O caminho pra se parar no meio é ir tanto, tanto de uma ponta a outra até que a velocidade diminua e o equilíbrio venha de tanto ir numa direção e em outra.

O leitor que começou o texto dando algumas risadas de repente deve ter congelado o riso até que este foi amarelando e amarelando. Essa sou eu. As pessoas em geral começam sorrindo e no final estão quase sem graça. Digo coisas engraçadinhas pra falar de assuntos sérios e falo sério pra falar de coisas simples. Exagero pra que a verdadeira verdade passe despercebida. Estórias e histórias se confudem - não por acaso meu doutorado é entre a história e a literatura, pois na verdade eu cada vez acredito menos nas diferenças entre as duas. Como diria aquele programa infantil: "entrou por uma porta saiu pela outra, quem quiser que conte outra..."

8 comentários:

Patricia Fernando disse...

100% de identificação. Queria que os outros entendessem que nós os "gordos" não somos tão fracos assim. E que acima de tudo, podemos ser fortes e seguros, mas nunca conseguimos ter o mesmo maldito metabolismo dos magros. Its a little more complicated than that.. é o que eu sempre digo pro meu marido que insiste que é só ter controle.. Anyway.. é bom saber que não estamos sós nesse universo tão obscuro. eheheh

bjs

Patricia

Anônimo disse...

"Um pacto de não-agressão" foi muuuuito bom, me fez dar uma risada de trincar vidraça. Putz, eu tenho o mesmo "pobrema". Quinze quilos ganharam amor pelo meu corpo e não querem mais ir embora. Nem com reza braba. E a "leitora tomando seu chá verde e que fez que sim com a cabeça" sou EU. Sim, eu engordei 15 kgs rapidinho, rapidinho. A tentação do Big Mac. Argh. Cara, teu post tá certíssimo. Beijos

Anônimo disse...

Somos fruto da era Xuxa e Angélica, onde magras e louras comandavam um programa para brasileiras baixinhas, gordinhas e morenas. Crescemos com essa síndrome de culpa do "DNA errado". Comer demais, beber demais, fumar demais, tudo tem um sentido. Mas é um sentido que só nos diz respeito. A Unilever descobriu isso e sacou a linha Dove, onde gordinhas e magrelas podem, sim, ser bonitas e felizes.
Acho que é essa a lição. No mais tenro recado: vamos ligar o botão do "F" (para bom entendedor...) para quem acha que a gente é fraco e infeliz. E, convido vocês a uma enquete com os homens: eles preferem as "Paris" e "Nicoles" ou gostam mesmo é de uma carne para apertar?
E olha que não estou chutando. Tenho um em casa. Ele pode até sonhar com a Bundchen, mas ele aperta outra pessoa:)))))))
A gente não sonha com o Giane e aperta outra pessoa? Então...

Carrie, a Estranha disse...

Pil,

Que bom q vc gostou, tb acho q é um pouco mais complicado q isso, mas ao mesmo tempo acho q a "culpa" não é só do metabolismo. O meu problema é comer em demasia.


Pat,

Putz! Nem me fale em McDonald's. Sou uma criança no McDonald's. Mesmo sabendo q a carne é refugo de sei lá o que, minhoca não sei das quantas...

Andrea,

Concordo com vc em parte. Acho q isso é uma tendência do mundo e não só do Brasil. E o meu problema não é só o excesso de peso. Mas é toda uma relação com a comida, de ansiedade e descontar os problemas emocionais... e se não der uma puxada no freio de mão de vez em qdo a coisa perde completamente o rumo.

Beijão a todas

Andrea disse...

Idem, idem. Acho ainda por cima que você devia escrever um roteira para um daqueles documentários definitivos. É exatamente isso. Demorei muito a entender que a comida era mais forte que eu. E isso é muito duro porque, para além do suposto charme, todo mundo já entende que um alcóolatra é doente. Já gordo, para o senso comum, nem piedade ganha e sofre mesmo é de falta de vergonha na cara. Só quem já se reconheceu num quadro de compulsão reconhece esses mecanismos perversos que você descreveu.

Beijão

Anônimo disse...

Eu acho que há uma supervalorização do conceito de "corpo perfeito". Se você não é magra, não tem cabelo liso e não é alta, você é escória. Reparou quantos nãos?

Ok, pode até ser um problema e ser prejudicial à saúde, mas em parte esses padrões que nos são bombardeados diariamente fazem a gente se sentir fora do aceitável e com culpa. Tem momentos em que é preciso ligar o "f", como disse a Andréa.

Você disse que come demais por motivos emocionais. Já tentou fazer outra coisa quando bate a ansiedade?

Karina disse...

Tbém 100% de identificação. Não é uma questão de querer um corpo perfeito, é uma questão de controle, só quem passa pelo problema e "acorda" um belo dia para a realidade de q está 15/20 kgs acima do peso entende. É difícil manter a disciplina. Parafraseando Victor Hugo, minha mãe uma vez disse ter ficado diante de um prato de comida pra provar quem é dono de quem. Sim, temos atitude pra começar a mudar, mas a grande questão não é a mudança. Como vc disse, é uma coisa q temos q adotar como estilo de vida, achar o ponto de equilíbrio. Ufa...
Vamos à luta q o caminho é longo. :D
Bj.

Carrie, a Estranha disse...

Andrea,

Documentário definitivo?! Hahahah...to morrendo de rir! Quem sabe? produtores? Alguém?

Azure,

Claro q tem a paranóia. Claro qnão quero pesar 30 quilos a menos para me parecer com a modelo X ou Y. Mas vc há de convir q a pessoa alterar quase 20 quilos num curto espaço de tempo não é algo muito normal.

Sim, já tentei fazer outras coisas qdo bate a ansiedade. Às vezes funciona, em outras não. E faço outras coisas tb para ver de onde vem tudo isso. Mas é uma coisa estranha. Só quem tem sabe como é.

Karina,

Muito boa a paráfrase do VH. VOu adotar.

Bjs, bjs e bjs