quinta-feira, maio 10, 2007

A vida é dura


Fui ver o cheiro do ralo. O filme. Não. Apaga. Não é isso. Queria conseguir escrever o filme. Não descrever o filme. Nem escrever sobre o filme. Assim mesmo, do jeito que está. Se esse filme fosse um texto.

A “Veja” deu três estrelas. O Jabor chamou de obra prima. Ainda bem que eu não trabalho na Veja. Nem sou o Jabor. Ainda bem que eu não leio jornal. Nem revista. Só sabia que era com o Selton Melo. Era o necessário.

Deveria contar a história do filme. Ou a atuação dos personagens. E também quem sabe usar adjetivos. Falar algo sobre a minha percepção. Mesclar dados objetivos e subjetivos.

O Jabor disse um monte de coisa. Que o filme é um retrato do país. Bobagem. E que é o início de um novo cinema. Odeio quando eu concordo com o Jabor. Ele descreve lá umas sensações que ele teve depois do filme. Acho que eu deveria fazer isso. Acho que eu estou fazendo isso.

O cheiro do ralo é ruim. Não o filme. O cheiro em si. Mas ele pode ser o que há de melhor. Não adianta tentar tapar o cheiro. A merda estoura pelos canos.

O filme não quer nada. Não se propõe a nada. Por isso cumpre. É justo. Em tudo. Cada coisa tem o seu exato porquê de estar ali. Cada figurino, cada gesto, cada ator, cada pequeno detalhe ou música. Nada sobra, nada falta.

Há também uma bunda. Que não tem a ver com o ralo. Quer dizer, até tem. Mas não da forma como vocês estão pensando.

Ah é. Também comprei uns livros. No sebo do Estação. O Estação não dá mais desconto pra correntista do Unibanco. Mas a mulher me deu. Deve ter visto minha cara de decepção. Ou de pobre. Minha carteirinha de estudante tá pronta. Mas eu não fui pegar. A pós fica no quinto andar. Tenho preguiça. E medo do elevador parar comigo e nunca mais ninguém me ver. O elevador do bloco O é louco. E os funcionários são públicos. Já vi uma garota ficando presa e eles se locomovendo tal qual uma centopéia para libertar a garota. Já pensaram? Tenho boas pernas.

Ah é. Os livros. Comprei mitologias do Barthes e contos da katherine mansfield. Aquela coleção bonita, parecida com a da Virginia Woolf. Elas eram amigas. Bloosmbury. Sebo. Sebo caro, mas sebo. E eu sempre choro um desconto.

Na saída fui na livraria ao lado. Achei o livro da moça que saiu no prosa e verso de sábado. Carol Saavedra. Eu gostei porque ela falou em várias coisas que eu acredito em literatura. Que é você ter conhecimento da tradição com a qual você está dialogando. Ela tem mestrado em comunicação. Escreveu o livro durante um ano na Alemanha, onde ela escrevia das 6:30 às 14h. Ano monástico, diz ela. Que também acha que o escritor abdica de coisas. Eu também acho. Mas acho que o jornalista que escreveu a matéria não acha. “Muito cerebral?” - ele diz – de jeito algum. Maldito século XIX e seus românticos.

Depois eu não tenho dinheiro pra nada e não sei porquê. Por alguma analogia estúpida eu acho que comprar livros é o mais importante. Todo o resto pode esperar. Posso andar com as mesmas roupas. Posso pular algumas refeições – o que seria bom, pois eu emagreceria – mas isso é uma grande bobagem. Preconceito intelectual. Bom, mas temos que fazer escolhas, não é? Pagar preços. O filme também é sobre isso.

O Jabor também compara o filme a Kafka e Bukowski. Eu tenho uma certa preguiça de Bukowiski desde que eu larguei a adolescência.

Então. Acho que o filme dialoga com a linguagem cinematográfica.

Lá pelas tantas o personagem do Selton diz: “Mulher é tudo igual. Bobeou elas mandam o convite pra gráfica”. Essa frase foi para mim o que “O mineiro só é solidário do câncer” foi para Edgar, personagem de Bonitinha, mas ordinária, de Nelson Rodrigues. É de uma verdade acachapante. O óbvio ululante.

O Raymond Williams, teórico da literatura e membro da New Left inglesa, usa um conceito chamado “estrutura de sentimento” para trabalhar com obras de arte. Seria mais ou menos dizer que toda a obra abraça a estrutura de sentimento de sua época. O quê de subjetivo de cada época. Bem mais ou menos dizendo. Isso não quer dizer que seja um retrato realista. Ela apreende o sentimento de uma dada época. Sentimento expressando não apenas emoção, mas sobretudo sensação. O filme não é muito localizado temporalmente nem geograficamente. As personagens têm sotaque de Minas, do Sul. Às vezes você acha que está nos anos 70 em outras 80. A moeda é o Real. Há computadores. Mas o figurino é quase dos Chips. Não é um filme realista, sem dúvida. Se lembram do Blecaute, livro do Marcelo Rubens Paiva? É meio que naquele clima. Mas é outra coisa.

Só vendo. Mas não esperem nada. É sempre o melhor ponto de partida.

2 comentários:

Anônimo disse...

oi carrie!
sim sim, eu tinha lido o post retirado. acho até q comentei nele, né? enfin... deixa pra lá...
menina, essa compulsão por livro eu tb tenho. só q não consigo ler td. aí fico sempre me dizendo q não vou comprar nenhum livro a mais eqto não terminar a pilha dos não lidos. acaba q não agüento e compro e a pilha vai aumentando!!!
comprar roupa, para q roupa?? hehehe!
bjks

Carrie, a Estranha disse...

Bella,

Com certeza! E aí eu coloco uma pilha de livros que tenho que ler, mas aí surgem outros q eu vou passando na frente...e a pilha nunca acaba! Rsrsrs...Como disse o Veríssimo, eu só tenho vaga na minha lista de coisas pra ler em 2028

bjs