quinta-feira, janeiro 13, 2011

Shit happens

Está em qualquer profecia/que o mundo se acaba um dia
(Raul Seixas)

Como quase todo mundo, muito triste com as imagens da tragédia na região serrana do Rio. Liguei para minha cunhada, cuja família é de Nova Friburgo, e ela disse que não consegue falar com eles desde ontem - e eles já estavam sem luz e sem água. Detalhe: eles são classe média alta. Não que tenha relevância se os mortos são ricos ou pobres, mas é que, durante muito tempo, tendemos a associar tragédias a ocupações irregulares de terrenos feitas, muitas vezes, pelos mais humildes e por total falta de opção. As últimas tragédias envolvendo chuva têm mostrado outra face. Que pra mim não faz a menor diferença, mas, (in)felizmente talvez faça para os nossos governantes.

Neste momento é interessante observar dois tipos de comportamento: o primeiro é achar que é fatalidade e que nada poderia ter sido feito. Deus manda a chuva, a geografia da serra não ajuda e dá nisso. Outra é achar que tudo poderia ser evitado, pois alertas foram dados e ninguém fez nada (países que estão sujeitos a fenômenos meteorológicos regulares já desenvolveram sistemas para lidar com isso, como não temos nada semelhante no Brasil?!). Mas ambas posições são errôneas, a meu ver. Ou ambas tem as suas razões. Afinal, estamos lidando, nos últimos tempos, com um grau de catástrofes naturais que acontecem talvez de século em século. Ou até mais. Ok, sempre morreu gente em enchente, em geral populações menos assistidas pelo poder público - e em geral morre-se justamente pelo descaso. Mas toda tragédia tem seu grau de inevitabilidade.

É natural que se busquem culpados. Quando algo tão grande e aleatório acontece a tendência é atribuirmos a uma Ordem Superior - seja ela Divina ou laica, representada na figura de Deus ou dos governantes - algum grau de responsabilidade. Afinal, como entender que o meu vizinho tenha morrido com toda a família e eu tenha conseguido escapar com vida? Ou que eu seja o único sobrevivente de uma família onde morreram 15 pessoas? Outro comportamento bastante comum é tentar jogar a culpa na própria vítima: ah, também quem mandou ir morar numa área de risco? Por que não saiu quando viu que estava chovendo?

O difícil é entender que algumas tragédias - ou alguma parte nas trágédias - poderiam ser evitadas, sim. Outras não. Mas, há sempre algo de aleatório nisso tudo.

A tendência mais recente é culpar a ação do homem sobre a natureza. Longe de mim contestar, os cientistas estão aí pra provar tudo, mas...até os dinossauros foram extintos, minha gente. Bicho grande, forte e que não poluía nada. O planeta vem passando por ciclos de destruição e reconstrução, esfriamento e aquecimento desde sempre. Um dia seremos nós. Mas nem por isso você deve deixar de ter pequenos gestos para melhorar o mundo enquanto estamos por aqui. Afinal, antes de tudo se acabar, ainda pode piorar muito. É como diz um amigo meu, que faz dieta, exercícios e controla a pressão depois de ter tido uns piripaques: o pior não é morrer. O pior é ter um derrame, ficar todo torto, ter outras complicações.

Mas, tergiverso.

Enfim. Não entendo nada sobre prevenção de catástrofes. Mas sempre me espanta a capacidade de, diante da dor, tentarmos encontrar um culpado.

PS: Vi de relance uma entrevista da Marília Gabriela com um astrólogo E psicólogo (isso mais parece legenda do Casseta & Planeta: "Pedro Bial, repórter e gato") que dizia que o terremoto no Haiti e a tragédia do furacão Katrina, no sul dos EUA, se explicam pela quantidade de vudu que é feita ali. Mudei de canal pra não ouvir a explicação.


PS 2: Aliás, pensando melhor, reflito se este não é o grande dilema da vida. Pelo menos pra mim é. Não o vudu, mas saber que os nossos atos são em alguma medida (que eu não sei qual) fruto de planejamento, esforço e em outra fruto do Acaso (ou Destino, ou Deus, que, no final das contas, dá no mesmo, já que não temos controle sobre). O problema é saber qual é qual e até que ponto precisamos ir e em que momento passa a ser não mais da nossa alçada.

Pois por mais que reforcemos nossas encostas, há momentos em que tudo simplesmente desaba.

7 comentários:

Alê disse...

Carrie, seu post está perfeito.
De verdade mesmo.
Não sei nem o que acrescentar, mas lembrei-me de duas coisas que tem a ver com o que você escreveu.

Para não citar a pessoa, vou resumir: já ouvi na rua onde moro a seguinte frase:

- Ah, até sacola plástica eu jogo pra rua, porque a água leva embora.

Parece até mantra esaa frase aí de cima, mas a água pode levar eu também.

Então, tudo que posso fazer para separar, recolher lixo corretamente e embrulhar em papel a lata que usei, eu faço, porque já vi lixeiro se machucar com sacos de lixo.

Prevenir de alguma forma, também acho que dá, porque senão me engano, assisti em algum canal que há lugares que tocam sirenes em caso de catástrofes.

Quanto ao psicólogo e astrologista, acho que nos afetamos por algo, se assim permitimos.

Eu não sei onde Deus interfere nisso tudo e também não sei até onde nossos atos são responsáveis, mas eu sei que o bueiro que fica ao lado de casa não pode entupir e para essa parte cabe a nós contribuirmos.

Beijos

Alê

Anônimo disse...

Aline, toda tragédia tem sim um grau de inevitabilidade, mas aí é que está a diferença. A questão é de evolução, em todos os sentidos. Na Austrália choveu o dobro do que choveu na região serrana e morreram 19 pessoas, enquanto aqui morreram mais de 500. Isso é um acidente, como qualquer outro, mas é um acidente anunciado, em que se pode evitar muitas mortes. Lá, como em qualquer lugar evoluído, existe planejamento urbanístico, compreensão da população de que a natureza deve ter seus limites respeitados, educação para não poluir, e o principal, não tem gente que precisa se amontoar em áreas de riscos, como morros e encostas, para ter um lugar (in)digno para sobreviver (ou morrer). Tudo isto e muito mais se trata simplesmente de evolução, em todos os sentidos. Não se trata de achar um culpado ou não, simplesmente porque isso não vai alterar em nada tudo que aconteceu. O principal problema é que isso tudo, como qualquer outra tragédia no Brasil, não vai servir para mudar nada, tudo vai continuar como antes, porque o povo vai voltar a subir as encostas, construir suas casas e as prefeituras continuar ignorando. Esse é um problema que daria horas de discussão sobre o assunto, mas basicamente é isso, falta de educação, de evolução, tanto de quem fiscaliza quanto de quem é fiscalizado. Agora esse papo de Deus, não tem nem lógica. A única coisa que diferencia um sobrevivente de um morto nessas situações é a sorte e o azar. É outro assunto também que não deve aqui ser alongado, mas, enfim, basicamente é isso. Me empolguei no comentário, mas tem coisas que realmente mexem comigo, e esse post foi uma delas. Um abração. Juninho

Carrie, a Estranha disse...

Oi Juninho,

Hehehe...nunca comenta, qdo comenta...rsrs...mas q bom q despertou a vontade de discutir.

Basicamente concordamos com tudo. Só acho q os meios de comunicação entram numa de "de quem é a culpa" e, ora bolas, se formos parar pra pensar mesmo, a culpa é nossa, de escolhermos esses governantes q aí estão e não fazem nada. Como vc mesmo disse, é um problema tão, tão, tão complexo q me parece meio injusto, numa hora dessas, vir com esse papo de "de quem é a culpa?". Claro q dá pra amenizar os estragos. Mas o discurso fica mto só nisso. Tb não sei o q deveria ser discutido nessas horas. Ou se alguma coisa precisa ser dicutida.

Eu vi a matéria falando sobre a Austrália, inclusive um físico brasileiro q mora lá dizendo q eles recebem uma carta em casa, meses antes... não discuto nada disso. Só q uma tragédia, dessa magnitude, nunca ocorreu no Brasil. Logo, fica difícil prever. Ok, todo ano morre gente em encosta e isso é mto triste. Mas nessas horas parece q a busca por um culpado é maior do q o resto.

Qto a segunda parte do seu comentário, realmente é um tema por demais complexo. E é uma das coisas q mais me intriga esse lance de sorte ou azar, destino ou acaso. Enfim. E sobre Deus ambos sabemos as posições um do outro. Só acho, como a Alê ali em cima, q Deus não tem nada a ver com isso. Como diria meu mestre, Woody Allen, "não é q Deus não exista. Ele apenas não está nem aí". Bom, religião, assim como opção sexual é uma coisa mto pessoal q tem a ver com as nossas vivências e experiências e é intransfirível.

Só acho q estamos caminhando para o fim do mundo. Seja em 2012 ou daqui a 50 anos e pouca coisa do q fizermos vai interfirir. Mas, claro, é preciso cuidar do planeta até lá, pq as condições podem piorar mto antes de acabarem.

Oi Alê!

É, é por aí eu acho.

Anônimo disse...

Carrie se quiser saber a resposta para algumas de suas dúvidas assista o vídeo sobre as 13 famílias que detém 70% de toda riqueza do mundo. Lá você vai ver sobre o plano dessas famílias de reduzir a população mundial a cerca de 1 bilhão e 200 milhões de pessoas. E então você vai entender muita coisa.
Boa sorte.

Carrie, a Estranha disse...

Anônimo,

Parei de acreditar em teorias conspiratórias no segundo grau. E, sendo historiadora e jornalista acredito na força da ação das pessoas.

Mas gostaria, sim, de ver, só de curiosidade - adoro catalogar paranóias coletivas, pois elas dizem mto sobre nossa época. Se vc puder deixar o nome do vídeo eu agradeço.

Anônimo disse...

Se quiser, assista também o vídeo "Prepare-se 1.6".

Anônimo disse...

Adorei seu post.
Se há um deus , é a força que regula a natureza, suas leis e fenômenos, não um ser preocupado com a vida de um ou de outro. Por que não dá para aceitar sofrimento de gente bacana, do bem. Mal comparando, quando vc dedetiza a sua casa, você fica preocupada com a mãe da barata, com a filha da barata?? Não, você quer o equilíbrio da sua casa. E tem sempre a barata sortuda que sobrevive. Para mim, a Natureza faz o mesmo, não tem ninguém lá em cima olhando por nós...
Acho que essas chuvas foram como uma tsunami ou terremoto... Uma tragédia muito triste, mas da natureza. O número de mortos poderia ter sido muito menor, é verdade, mas tem gente que morreu sem estar em área de risco. Quem sairia de casa após um alerta se nós nunca havíamos passado por isso? Não temos cultura de emergência, nunca precisamos ter. Acho que as coisas vão mudar daqui para frente. Vou a Teresópolis há 40 anos e nunca vi nada igual.
Monica