terça-feira, maio 06, 2008


“Diego não conhecia o mar. O pai, Santiago Kovadloff,
levou-o para que descobrisse o mar.
Viajaram para o Sul.
Ele, o mar, estava do outro lado das dunas altas, esperando.
Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas alturas de areia,
depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus olhos.
E foi tanta a imensidão do mar, e tanto seu fulgor, que o menino ficou mudo de beleza.
E quando finalmente conseguiu falar, tremendo, gaguejando, pediu ao pai:
- Me ajuda a olhar!"

(Eduardo Galeano - "O livro dos abraços")






Não me perguntem sobre os meus problemas hidráulicos. É sério. Não me perguntem. Eu não tenho mais forças pra falar sobre isso. Eu não quero mais falar sobre isso. Já chega eu ter que viver isso. Encerro a saga aqui.

(O pior de ter um blog – olha que eu quase só consigo ver vantagens em se ter um blog – é que eu me vejo querendo dar satisfação da minha vida pras pessoas que me lêem. Como se eu fosse algum tipo de celebridade ou pessoa pública que deve explicações sobre o que faz ou deixa de fazer. Acho que eu preciso de uma assessora de imagem).

Eu queria escrever sobre um monte de coisas que eu vi e vivi esse feriado. Mas elas não são escrevíveis. Não são passíveis de descrição sem parecer extremamente piegas. Ou talvez eu esteja sem paciência para tentar descrevê-las. Só pra resumir: eu chorei num casamento. Não, eu não costumo chorar em casamentos. Eu não sou esse tipo de pessoa. Nada contra quem chora em casamento, mas eu não choro. Nem em enterro. Mas choro em propaganda de perfume. E em filmes que ninguém chora. E em cenas que eu vejo no meio da rua – e só eu vejo, mais ninguém. E com poesia. E livro. E em momentos absolutamente ridículos e corriqueiros e banais. E de ver, simplesmente ver, certas pessoas, paisagens ou lugares. De ver tanta beleza e ela doer – porque fatalmente fenecerá. E de outras coisas que eu não posso falar. Mas eu chorei num casamento. Não por ver o amor, nem nada disso. Por ver rostos tão familiares adentrando a igreja e junto com eles histórias que desfilaram diante de minhas combalidas retinas. Histórias que ganharam vida por alguns instantes, tornando-se mais do que cenas longínquas que eu duvidava se de fato haviam ocorrido. Gente que mudou tanto, tanto que no final voltou a ser o que sempre foi. Gente que não mudou nada e por isso mesmo se tornou um estranho. Gente que eu descobri que ainda pensa nas coisas que eu penso. E quando eu olhei pro lado eu vi que não estava só. Mais gente tinha visto o que eu vi. Mais gente sentiu o que eu senti.

Cansada demais – realmente cansada; cansada de pensar as mesmas coisas, de tentar as mesmas soluções, de temer as mesmas coisas e não temer outras tantas; cansada – frágil demais.

Preciso mudar. Preciso mudar pra finalmente ter a minha vida. Ela anda por aí, sem mim. Coitadinha. Pode estar com frio e fome. Deve andar assustada.Eu preciso mudar pra voltar a ser quem um dia eu fui. Ou quem sabe alguém que eu nunca fui. Ou ainda alguém que vai aprender a estar. Nunca ser. Dia a dia. Não-ser.
Eu disse que não era escrevível, mas fui insistir...

10 comentários:

Sardas disse...

Putz, e tu ainda diz que não é escrevível. Imagina se fosse!!! Eu me desidrataria de tanto chorar. Sim, eu sou uma pessoa que chora. Em casamento, velório, comercial de pasta de dente (às vezes choro de raiva, de tão ruim que é, hehe), choro em filmes e ao ver velhinhos passando fome nas ruas. Eu choro. E claaaaaaaaro chorei um pouquito lendo teu texto. NÃO ESCREVE MAIS SOBRE ISSO, please, senão me desidrato!!!
Beijos, grandes.
Pati Linden

P.S. Se quiser uma assessora de imagem, de imprensa, de assuntos exteriores, tô na área. Minhas exigências: apartamento de frente pra Lagoa, motorista 24 horas (de preferência o Santoro), e saláriozinho à combinar (em euro, claro).

vera maria disse...

Carrie, quando algum possível aluno perguntar o que é a literatura de Clarice, dê a ele esse post como introdução :)
um abraço,
clara lopez

ps. há alguns anos eu passeava sempre no aterro, mas houve um momento em que parei de ir porque eram tantas histórias que eu via nos rostos das pessoas que
foi ficando difícil.

Anônimo disse...

Chorei hoje de manhã ouvindo uma música que me lembrava uma época, que me lembrava alguém, que me lembrava um lugar, e... (parece aquele poema da lili que não amava ninguém, poxa vida!) hahahaha.

Chorar ás vezes é bom. Às vezes não é. Mas que dá um alívio, ah! isso dá!

a que deseja disse...

Oi Carrie, quando li seu post me surpreendi pelas coincidências de nossos finais de semana.

Também escrevi sobre isso, se quiser passe por lá.

Beijo e boa sorte com as suas mudanças.

Bárbara Anaissi disse...

"Me ajuda a olhar" é lindo. E são tantas coisas q dão vontade de pedir essa ajuda... foi escrevível sim ;-) bjs

Carrie, a Estranha disse...

Oi, Pati!

Um puxadinho no framengo serve? Rsrsrsrs

Clara,

Puxa! Um elogio desses vindo de vc...olha q eu acredito, hein?

Nóis,

Eu choro muito. Só não choro pelas coisas q se costuma chorar.

A que deseja,

Vou ler sim!

Bárbara,

Esse texto do galeano é lindo, não?

bjs

manumaluca disse...

Cara, eu adoro o seu blog. Leio sempre. Para falar a verdade, todos os dias. Nunca comentei nada pois achava desnecessário, mas hoje... Que post é esse? Não sei se é a TPM, mas me fez chorar. Me fez pensar na vida e para onde ela tá me levando.

Queria ter tido a sorte de encontrar professores competentes como você no curso de comunicação. Tiveram uns 3 ou 4, é verdade. Mas faltou alguém com o seu conteúdo.

Carrie, a Estranha disse...

Manumaluca,

Muito obrigada. Mesmo. De coração.

:)

Anônimo disse...

Descobri isso por aqui por acaso. E tenho silenciosamente visitado desde então. O que eu vou falar vai soar a coisa mais bizarra do mundo. Mas, here it goes.

Carrie,

Seja você quem for, é amor o que desperta em mim. Só por ser quem você é. E por ter a bondade de se dividir conosco.

Beijos!

Carrie, a Estranha disse...

Tata,

Nossa. Eu não mereço, mas obrigada. E eu não sou generosa em dividir. Eu sou egoísta demais e só consigo e posso e sou impingida a falar sobre mim. Mas q bom q isso é visto como uma coisa boa.

Beijos