Guerra é uma parada que mexe comigo. Mesmo nunca tendo estado em nenhuma. Arrisco a dizer que foi um dos motivos que me fez fazer jornalismo. Isso e o fato de gostar de escrever.
Na minha infância um dos meus piores pesadelos era saber que o mundo podia acabar em uma guerra entre URSS e EUA - e existia um mito de que era só uma das duas potências apertar um tal "botão vermelho" que tudo iria pelos ares. Perdia noites de sono pensando nisso. Li o Diário de Anne Frank com 8 ou 9 anos. Me lembro também da primeira guerra in real time que eu assisti: foi a do Golfo, acho que em 1990 ou 91. Estava em São Sabastião, litoral de SP, na casa que uma tia alugou. Outra tia, muito católica, resolveu rezar um terço pra guerra terminar logo. No segundo ano do segundo grau, em 1992, eu assistia ao Bial falando diretamente da Iugoslávia e pensava "caramba, é isso que eu quero fazer, quero ver a história quando ela acontece. Ser testemunha ocular" - e outras bobagens do tipo que só uma garota de 16 anos é capaz de pensar. Um pouco depois li o Diário de Zlata, onde uma garota iugoslava narrava a guerra no seu diário - mas, graças a Deus, não morreu. Mal sabia que eu queria, na verdade, era um pouco disso tudo - história, estórias e vida. E que a história acontece em toda parte, a todo o momento e é feita pelas pessoas comuns.
O tempo passou, o Bial, coitado, paga mico apresentando o Big Brother e sendo dublê de Armando Nogueira, e meu desejo de ser jornalista ficou lá atrás, mais precisamente perdido na primeira aula em que me disseram que jornalista tem de ser neutro, imparcial e objetivo e responder às seis perguntinhas do lead (ou lide): quem - ou o quê -, quando, como, por quê - e uma sexta que eu sempre esqueço. Mas o meu fascínio pelas guerras continua. Fico chocada. Choro em frente a TV. Durante os ataques de 11/09 eu chorava copiosamente em frente à tv e mais ainda depois, com o bombardeio do Afeganistão e Iraque. Choro com freqüência diante dos noticiários. Me apavora a insanidade do ser humano em depredar a vida alheia. Sem contar que sempre acho uma burrice tremenda. Sempre morrem muitos dos dois lados e o problema nunca é resolvido.
Bom, e por que estou falando tudo isso? Porque vendo o recente bombardeio do Líbano pelo Iraque eu simplesmente não senti nada. Apenas um enorme cansaço. Não sei se eu estou me anestesiando ou se de repente tudo ficou muito normal. Ou se minhas guerras particulares estão me tomando muito tempo.
Nessa guerra eu confesso que eu joguei a toalha. Não que o fato de eu me indignar ou não vá mudar alguma coisa. Que o terço da minha tia vá mudar alguma coisa. Mas o fato é que hoje me deu um cansaço maior do que tudo. Vejo que inúmeros relatos estão sendo produzidos via web. Inclusive em blogs. São as novas Zlatas, Anne Franks...só que numa velocidade muito maior. E ouvindo as pessoas darem depoimentos sobre a guerra, me chamou atenção a frase de uma jornalista libanesa, num blog. Ela dizia algo como "até quando Beirute será destruída e reconstruída? Até quando vai a capacidade de se decepcionar e se apaixonar de novo?". E percebi de repente porque essa guerra não está me despertando nenhuma emoção. Eu simplesmente parei de acreditar. Em reconstruções. Em amores. Na bondade do ser humano e na capacidade de diálogo. Temo que minha capacidade de acreditar em algo - que nunca foi assim uma Brastemp - tenha sido solapada completamente na minha última desilusão amorosa e no pouco que eu vi e vivi da história. E isso me assusta porque eu tenho "apenas" 29 anos. Não é pouco, mas não é nem metade de uma vida e não é nada se comparado à História. E me assusta mais ainda porque esse sentimento de cansaço me acompanha desde pequena. Aos 18 anos eu achava que "já tinha 18 anos" e aquilo já era muito. Acho que sou "um espírito velho".
Me lembrei de um caso contado por um querido tio, figura - como todos os meus parentes, aliás. Esse meu tio ouvia um amigo narrar desgraças de sua vida financeira. No final, este amigo diz que tinha inveja de seus pais, pois já tinham morrido e tinha pena de seus filhos e netos. Em seguida perguntou ao meu tio se ele não sentia o mesmo. Meu tio parou, pensou e respondeu em seguida:
Não. Dos meus pais eu não tenho inveja, não. Tenho inveja dos Faraós do Egito Antigo que morreram a milhares de anos e deles não sobrou nem cabelo nem nada.
Depois dessa frase acho que mais nada precisa ser dito. Caso encerrado.
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