terça-feira, julho 18, 2006

Casca de ferida



Saiu dali se sentindo do avesso. Repetia para si mesma todas aquelas frases feitas de que o tempo cura todas as feridas e que isso passa. Mas a verdade era que de tempos em tempo a casca da sua ferida era arrancada e tudo voltara a sangrar novamente. O que mudara era a rapidez com que uma nova casca era formada. Mas a ferida continuava lá, prestes a ser cutucada a qualquer momento.
É estranho como os sentimentos das pessoas são. Fica-se anos sem sentir uma coisa e de repente aquilo vem aos borbotões, como água represada, como se nunca tivesse estado ausente. Sentia-se tão triste que os momentos felizes pareciam que nunca existiram de fato. Mas ela sabia que era mentira. E que quando fosse feliz novamente aquela tristeza parecerá que nunca existiu também. Sentimentos muito intensos tem disso: só fazem sentido no tempo presente, depois a gente esquece como eles são.
Tinha momentos como aquele onde a simples menção do seu nome lhe desestabilizava completamente. E sentia ódio de si mesma por isso. Pois sabia que não era mais amor o que sentia. Era uma dor lancinante. Um ato reflexo. Um registro de dor no qual aprendera viver e que nem anos e mais anos de análise e nem todos os anti-depressivos do mundo fizeram-na mudar. Dor. Não acreditava em grande amor da vida, nem em alma gêmea e nem em nenhuma dessas outras coisas. Simplesmente não conseguia explicar o que se passava - e isso a deixava furiosa.
E havia momentos como aquele onde tinha que deixar a ferida exposta, sangrando durante algum tempo. Só ela estava vendo. Ninguém mais. Deixava-se abandonar em suas próprias lágrimas e se perdia na sua própria dor, sem tentar entender nada, esperar nada, lutar contra nada. Logo mais outra ferida viria e ela se sentiria novamente em segurança durante algum tempo. Sua vida agora se resumia a isso.
E se sentia uma estranha. Não conhecia ninguém que passasse por isso. Só ela. Justo ela. Desistiu de tentar entender. Desistiu de tentar esquecer. Apenas se abandonava a própria sorte. Quem sabe Deus ou qualquer outra coisa que exista sinta pena dela um dia e a livre desse tormento.

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